A
poeira presente nas áreas de Brumadinho atingidas pelo rompimento de
uma barragem da mineradora Vale trouxe impactos para a saúde das
crianças, diz estudo produzido por pesquisadores da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). O
trabalho é parte do Projeto Bruminha, criado para avaliar a saúde das
crianças com idade até 6 anos nas comunidades impactadas ao longo de um
período de quatro anos, entre 2021 e 2024.
Nas áreas atingidas pela tragédia, houve 75%
mais relatos de alergia respiratória em comparação com uma localidade
não afetada. Além disso, o estudo mostra que as crianças das comunidades
expostas à poeira decorrente do rompimento de barragem apresentaram
três vezes mais chance de desenvolver alergia respiratória do que as
demais. Os resultados constam de artigo recém-publicado nos Cadernos de Saúde Pública, revista científica da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz.
A faixa etária acima de 4 anos foi a que
mais apresentou problemas de saúde envolvendo alergias respiratórias e
comprometimento das vias aéreas superiores e inferiores. De acordo com
os pesquisadores, crianças nessa idade tendem a ter mais acesso a
ambientes externos, o que resulta em maior exposição à poeira. Nesse
grupo, 68,3% tiveram rinite, sinusite ou otite; 72,2% desenvolveram
pneumonia, asma, sibilos ou bronquite, além de 59,4% terem se queixado
de alergias.
Ainda conforme os dados da pesquisa,
problemas envolvendo as crianças do sexo masculino foram relatados com
mais frequência. "Podem estar associados a características culturais dos
territórios, que determinam maior acesso dos meninos aos espaços
externos e comunitários, por meio de jogos coletivos nas quadras de
escolas e associações, praças e campos de futebol", registra o artigo.
A tragédia no município mineiro ocorreu em
25 de janeiro de 2019. O rompimento da barragem liberou uma avalanche de
rejeitos que gerou grandes impactos nos municípios da bacia do Rio
Paraopeba. Ao todo, foram perdidas 272 vidas, incluindo nessa conta dois
bebês de mulheres que estavam grávidas.
Em fevereiro de 2021, acordo de reparação
foi firmado entre a Vale, o governo estadual, o Ministério Público de
Minas Gerais, o Ministério Público Federal e a Defensoria Pública do
estado. A Vale se comprometeu com aportes que somam R$ 37,68 bilhões,
incluindo investimentos socioeconômicos, ações de recuperação
socioambiental, ações voltadas para garantir a segurança hídrica,
melhorias dos serviços públicos e obras de mobilidade urbana, entre
outras.
Em janeiro deste ano, populações atingidas realizaram um ato para marcar os cinco anos de tragédia e criticaram o processo respiratório.
Questões de saúde ainda devem demandar
recursos adicionais. Estão em andamento os Estudos de Risco à Saúde
Humana e Risco Ecológico, sob responsabilidade do Grupo EPA e custeio da
Vale, tal como definido em decisão judicial. O trabalho trará
conclusões sobre a saúde humana, a fauna e a flora e embasará o
julgamento dessas questões. Medidas estabelecidas com base em achados da
pesquisa deverão ser asseguradas pela mineradora com novos aportes, não
sendo descontados dos R$ 37,68 bilhões fixados pelo acordo.
Segundo os pesquisadores da UFRJ e da
Fiocruz, os novos resultados obtidos por meio do Projeto Bruminha
fornecem subsídios para fixar ações de assistência desenvolvidas no
âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
O estudo foi realizado em três comunidades: Córrego do Feijão, Parque da
Cachoeira e Tejuco. Para comparação, também foram coletados dados na
comunidade de Aranha, também impactada na tragédia. No total, 217
crianças de até 6 anos foram avaliadas. O trabalho de campo e a coleta
de informações ocorreu em julho de 2021, cerca de um ano e meio após a
ruptura da barragem.
O estudo levantou ainda dados sobre a rotina
da população após a tragédia. De acordo com os resultados, 89,3% dos
moradores de comunidades atingidas relataram limpar com mais frequência
suas residências por causa da poeira. Além disso, 89,4% afirmaram
consumir água mineral.