Órgãos
e plataformas de direitos do consumidor têm recebido, nos últimos
dias, diversas reclamações de pessoas que adquiriram passagens para
voos da empresa Voepass. Elas estão relatando dificuldades para
cancelar viagens e obter o reembolso total do valor pago ou
realocação em outros voos.
No
Reclame
Aqui,
plataforma que permite o registro de opinião e de reclamações
sobre a experiência de compra ou de serviços, por exemplo, diversos
consumidores têm reclamado que adquiriram voos pela Latam, mas que
perceberam depois que aqueles voos seriam operados pela Voepass e,
por isso, pedem realocação para outra companhia.
Após
o acidente aéreo na última sexta-feira (9) com uma aeronave da
Voepass que provocou a morte de 62 pessoas, muitos consumidores têm
relatado insegurança em viajar de avião e com muitas dúvidas sobre
seus direitos.
Por
isso, a Agência
Brasil
e a
TV Brasil procuraram
Roberta Andreoli, presidente da Comissão Especial de Direito
Aeronáutico da Ordem dos Advogados do Brasil em São Paulo (OAB SP)
para esclarecer o assunto.
“Acho
que a primeira coisa que a gente tem que colocar diante dessa
situação aflorada é que toda a linha aérea no Brasil, para ela
poder prestar o serviço de transporte aéreo de passageiro, ela
passa por um processo de certificação junto à Autoridade
Aeronáutica Brasileira, que é a Agência Nacional de Aviação
Civil (Anac). A maior diretriz da Anac é garantir a segurança de
voo. Então, para aquela aeronave estar operando naquele voo
específico, isso significa que ela foi checada e que a linha passa
por todos os processos de manutenção programada e esporádica,
quando necessário”, disse ela.
Segurança
Em
nota publicada hoje (14) em seu portal, a Anac reforçou que a
aviação brasileira é segura e que segue os mais rigorosos padrões
internacionais de segurança da aviação civil.
“A
Anac reitera seu compromisso com a segurança da aviação e reforça
que todas as empresas aéreas que operam voos comerciais no
transporte aéreo regular de passageiros no Brasil são
permanentemente monitoradas e fiscalizadas pela agência”,
esclareceu.
Inicialmente,
o que o consumidor precisa saber é que não há previsão de
cancelamento ou reembolso de passagens por não se sentir seguro em
viajar.
“O
receio de que algo semelhante (acidente) ocorra com o voo contratado
pelo consumidor não se manifesta como situação de exposição de
risco à vida, considerando que as companhias tiveram as aeronaves
certificadas pelos órgãos reguladores do transporte aéreo”,
explica o Procon de São Paulo, por meio de nota.
No
entanto, esclareceu a presidente da Comissão Especial de Direito
Aeronáutico da OAB de São Paulo, caso o passageiro ainda se sinta
inseguro em viajar, o ideal é que ele converse com a tripulação
antes que o procedimento de embarque seja encerrado. “Em uma
situação em que o passageiro se sente inseguro de continuar o voo,
independente do motivo dessa insegurança, o que eu posso dizer é
que cada voo é uma experiência individual e que, se o procedimento
de embarque e desembarque da aeronave ainda estiver acontecendo, esse
passageiro poderia conversar com a tripulação”, sugeriu ela.
Caso
o procedimento de embarque já tenha sido encerrado, a desistência
não será mais possível, ressaltou a especialista.
“Após
o encerramento desse procedimento, essa decisão individual do
passageiro pode prejudicar todo o andamento da infraestrutura do ar e
atrasar a escala dos voos e os horários de decolagem e pouso. Nessa
situação, muito provavelmente ele não vai conseguir desembarcar da
aeronave até por motivos de segurança”.
O
consumidor deve saber também que, em caso de desistência do voo, os
custos podem ficar por conta dele. “Cada compra de ticket
de
passagem aérea estabelece uma regra de condições. Cada ticket
tem direitos e obrigações, tanto do passageiro quanto da companhia
aérea. Mas não é normal ou usual vermos contratos que permitam
essa desistência imediata [sem custos ou perdas para o consumidor]”,
disse Roberta Andreoli.
Segundo
o Procon, se o consumidor optar por cancelar o voo, ele estará
sujeito às regras do contrato firmado e às determinações da Anac
1 (Resolução 400/2016).
“No
entendimento do Procon-SP, o direito de arrependimento poderá ser
aplicado considerando o prazo legal de sete dias de arrependimento
para compras efetuadas fora do estabelecimento comercial”, disse o
Procon, em nota.
Isso
significa que - até sete dias úteis após a compra fora do
estabelecimento comercial - o cliente pode cancelar e pedir
reembolso, sem qualquer motivo. Fora desse prazo, no entanto, ele
pode estar sujeito a penalidades, como multas.
Reclamações
À
Agência
Brasil,
a plataforma Reclame
Aqui
informou que, só neste ano de 2024 [até o dia do acidente], recebeu
577 reclamações de consumidores sobre a Voepass. Em todo o ano
passado foram 520 reclamações. Os principais problemas relatados
pelos consumidores sobre essa companhia aérea entre 2022 e 2024
foram relacionados ao cancelamento de voo (226 reclamações),
seguido por qualidade do serviço prestado (213 reclamações) e
reembolso (209 reclamações). Houve também reclamações sobre
estorno do valor pago, mau atendimento e atraso na decolagem.
Já
o Procon-SP informou ter recebido 48 reclamações sobre a companhia
área entre os meses de janeiro e agosto. No ano passado foram 45
reclamações.
A
maioria das reivindicações dos consumidores dizia respeito à
dificuldade na devolução dos valores pagos ou de reembolso (27
reclamações), seguido por demandas não resolvidas ou não
respondidas pelo Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) da
companhia (20 reclamações) e serviço não fornecido ou venda
enganosa (14).
O
problema envolvendo o compartilhamento de voos (codeshare)
entre a Voepass e a Latam é uma das reclamações que mais
apareceram no site Reclame
Aqui
nos últimos dias. Segundo o Procon, o codeshare
não é ilegal, mas o Procon tem analisado as reclamações dos
consumidores sobre esse tema. “A prática de codeshare
é legal e autorizada pelos órgãos reguladores da aviação civil”,
disse o órgão.
O
Instituto de Defesa de Consumidores (Idec) esclareceu que toda
informação sobre quem será o responsável por cumprir o contrato
de transporte aéreo deve ser dada de maneira antecipada ao
consumidor e de forma adequada e clara.
“Portanto,
no caso de ser aplicada a regra de codeshare,
em que uma empresa aérea tem parceria com outra para voar em
determinadas rotas, o consumidor deve ter informações claras e
antecipadas, logo no primeiro momento de selecionar o voo’, disse o
Idec.
Caso
essa informação não esteja presente ou haja descumprimento dessa
oferta, informou o Idec, será possível exigir o cumprimento forçado
da obrigação ou a rescisão do contrato, além de se poder aceitar
a oferta de um prestador de serviço equivalente.
“Caso
não existam rotas trabalhadas pelas companhias aéreas em que o
consumidor comprou a passagem, como a Latam, mas somente codeshare
com outras companhias e o consumidor não se sentir seguro em viajar
com empresas que não conhece, o ideal é pedir a rescisão
contratual, exigir o valor pago pelas passagens aéreas de volta e,
se houver outros prejuízos, perdas e danos”.
O
consumidor, destacou o Procon, pode fazer quaisquer reclamações
sobre problemas envolvendo uma aeronave ou companhia aérea. Essa
reclamação pode ser feita, por exemplo, no Procon de sua cidade ou
estado, “cabendo à empresa demonstrar que os problemas encontrados
foram resolvidos e reportados aos órgãos reguladores e não
comprometem a aeronavegabilidade.
Caso
não haja resposta da empresa envolvida e o problema comprometa a
oferta efetuada, a situação poderá ser considerada má prestação
dos serviços, passível de sanções com base no Código de Defesa
do Consumidor”.
Outro
lado
Procurada
pela reportagem, a Latam informou que, no mercado de aviação civil,
é comum que as companhias aéreas façam acordos que permitam que
uma empresa venda passagens aéreas de voos operados por outras
companhias. Segundo a Latam, essa informação é apresentada ao
passageiro desde a etapa de pesquisa de passagens. “A prática é
autorizada pelas autoridades reguladoras do transporte aéreo no
Brasil e no mundo. Não há ingerência de uma empresa sobre a
operação da outra”, diz nota.
No
entanto, destacou a Latam, a companhia operadora do voo é que é
responsável “por toda a sua gestão técnica e operacional, desde
o atendimento em solo aos passageiros nos aeroportos, mas também
durante os voos, até o cumprimento das diretrizes de
aeronavegabilidade da aeronave, incluindo sua manutenção e a
contratação de seguros obrigatórios”.
Sobre
os reembolsos e remarcações, a Latam informou que o cliente pode
reembolsar ou remarcar sua passagem sem custos e multa sempre que o
voo for cancelado, seja ele operado pela própria companhia ou em
codeshare.
Já
a Voepass informou que “trabalha arduamente para atender às
expectativas de seus clientes”. “A empresa é solidária a
eventuais queixas, que são consideradas para aprimorar a prestação
de nossos serviços, e concentra o atendimento a elas em seus canais
oficiais”, diz nota da Voepass.