O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a acender o sinal de alerta sobre o risco iminente de colapso fiscal a partir de 2027, mas, contraditoriamente, deixou os precatórios fora da revisão de gastos
prevista no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026,
enviado na terça-feira (15) ao Congresso Nacional. A decisão adia, mais
uma vez, a discussão sobre o maior passivo financeiro judicial do Estado brasileiro — e enfraquece a credibilidade da promessa de ajuste.
Apesar dos sinais de deterioração nas contas públicas, o governo optou por preservar uma espécie de zona de conforto política, deixando intacto o tratamento especial aos precatórios, cujos valores devem crescer de R$ 115,7 bilhões em 2026 para mais de R$ 144 bilhões em 2029.
Segundo estimativas da equipe econômica, as despesas obrigatórias — como salários, aposentadorias, benefícios sociais e transferências constitucionais — vão saltar de R$ 2,39 trilhões em 2026 para R$ 2,84 trilhões em 2029. O avanço corrosivo dessas despesas já compromete o funcionamento básico do Estado. O próprio secretário de Orçamento Federal, Clayton Montes, foi direto:
Ou seja: o governo sabe do buraco, mas ainda não decidiu como (ou se) vai enfrentá-lo.
A consequência prática é grave: o orçamento para despesas discricionárias, que sustenta investimentos, manutenção da máquina pública e parte dos gastos em saúde e educação, despenca para apenas R$ 8,9 bilhões em 2029.
Isso representa um colapso funcional, já que a própria regra do novo
arcabouço fiscal determina um piso mínimo de R$ 170 bilhões para esse
tipo de gasto, com base na média histórica.
Enquanto os técnicos admitem o rombo, a questão dos precatórios segue sendo empurrada para o governo seguinte.
Em 2027, essas dívidas judiciais voltam a contar integralmente no
cálculo do teto de gastos, encerrando o “alívio temporário” concedido
anteriormente pelo Supremo Tribunal Federal.
A justificativa oficial é que o debate ainda será amadurecido, talvez, só depois das eleições de 2026 — ou seja, a estratégia é clara: não falar disso agora para não pagar o preço político.
A secretária-adjunta do Tesouro Nacional, Viviane Veiga, chegou a dizer que os precatórios não estão sob medidas de revisão de gastos porque envolvem um processo mais amplo:
O problema é que R$ 144 bilhões em dívidas judiciais fora do radar de controle
é, sim, explosivo — e corrosivo. A insistência em tratá-los como “não
prioridade” fragiliza qualquer discurso de responsabilidade fiscal.
O governo menciona iniciativas tímidas como revisão de cadastros no BPC, na Previdência e no Proagro, mas os resultados também minguaram. A economia prevista caiu de R$ 28,6 bilhões em 2023 para R$ 16,4 bilhões agora. Em termos proporcionais, isso é quase irrelevante diante do ritmo de crescimento das despesas obrigatórias.
Sem enfrentar os grandes
passivos — como precatórios, folha de pagamentos e judicialização
crescente de benefícios — o que sobra é ficar refém do ajuste simbólico, enquanto o espaço real para investir e manter o Estado funcionando derrete sob o peso da omissão.
A
falta de decisões duras hoje cobra juros mais altos amanhã — não apenas
no mercado, mas no cotidiano da população que depende de serviços
públicos funcionando.
Enquanto os precatórios
continuam crescendo, e os gastos obrigatórios consomem quase a
totalidade do Orçamento, o Estado se aproxima perigosamente de um
cenário de paralisia institucional forçada por falta de espaço fiscal.
Se o risco de colapso está no radar, a negação em agir com seriedade sobre os precatórios transforma a ameaça em destino provável. E dessa vez, ninguém poderá dizer que foi pego de surpresa.